SUPERAÇÃO




 Recentemente tivemos um caso no hospital,que para nossa equipe não foi um caso inédito,mas que impressiona por suas possíveis sequelas.
   Internamos em nosso serviço a Y.,07 anos,portadora de anemia falciforme.Uma doença com a qual o paciente já nasce mas nem sempre se manifesta no início da vida.Para ter a doença,é necessário que pai e mãe sejam portadores(estes podem não manifestar a doença,mas podem transmitir aos filhos).A mesma, trata-se de uma doença na qual as hemácias(células vermelhas do sangue), perante alguns estímulos variados,tomam a forma de uma foice,o que lhe justifica o nome falciforme.Este formato prejudica sua circulação normal acarretando uma série de problemas, como dores intensas (pela má circulação),produção anômalas de células,prejuízos ao baço (órgão muito envolvido  com a imunidade ) com consequente prejuízo à defesa do paciente a infecções.
  São inúmeras as complicações  desta doença levando esses pacientes a uma infância bem difícil com várias internações,transfusões sanguineas e muitas vezes sequelas prejudicando seu dia a dia e sua vida escolar..As pessoas normalmente fazem tratamento até o fim de suas vidas.A doença porém não é curável,pois as hemácias  de seu organismo sempre serão produzidas com a Hemoglobina (parte da hemácia), alteradas.
   Uma das piores,se não for a pior complicação desta doença é quando as hemácias tomam a forma de foice,tornando o sangue de difícil circulação numa área tão nobre do corpo que é o cérebro,tendo este então sua circulação prejudicada levando ao tão temido A.V.C ou acidente vascular cerebral,devido à má irrigação sanguínea de uma parte do cérebro.Isso pode causar sintomas,dependendo da área acometida.
  E infelizmente foi o que aconteceu com a Y.Ela deu entrada em nosso serviço ,tendo passado vários dias em pronto socorro com uma dor de cabeça e dificuldade em movimentar perna e braço esquerdos,além de alteração em sua fala.Realizada  uma Tomografia e posteriormente uma Ressonância magnética de crânio,constatou-se  que realmente em uma área de seu cérebro ocorrera uma isquemia,isto é falta de irrigação sanguínea.
   Sua  mãe no primeiro dia conosco mostrava-se extremamente desanimada,o que é totalmente compreensível ainda mais sendo a Y. uma de seus cinco filhos sendo que três deles apresentam a doença falciforme e dentre eles um já tivera A.V.C. e já encontra-se em uma cadeira de rodas.
  Naquele dia,claro que eu jamais poderia sentir a dor da mãe de Y.,mas um abraço forte pude oferecer.Uma palavra de fé ,de encorajamento,mesmo me sentindo tão constrangida em tentar dar esperança a uma mãe com aquele histórico.
   Sua mãe aos poucos foi se animando,retomando forças vindas do Alto e isso foi influenciando positivamente no decurso da evolução de Y.de tal forma que comecei vê-la sorrir.
   Y. aos poucos foi voltando a falar e alegrava-se cada vez em que eu ia até seu leito.Apresentei seu caso aos alunos do terceiro ano da faculdade,que visitam nossa enfermaria às tardes  para aprenderem Pediatria na prática e tanto Y. como sua mãe foram extremamente receptivas e colaborativas com os alunos,de forma que no dia seguinte Y. perguntou se eles viriam de novo e um novo grupo de cinco alunos a visitou.Todos ficaram surpresos de como ela sorria numa situação como aquela,de onde aquela mãe tirava ânimo e eu sabia:"O poder de Deus se aperfeiçoa em nossa fraqueza"(II Co 12:9).

   E eis que chega o dia tão esperado da festa junina que os alunos do sexto ano de medicina (nossa enfermaria recebe muitos alunos!!!). Uma festa de verdade.Para aqueles pacientes uma festança, realizada devido ao projeto que temos chamado "Humaniza-Ped",do qual eu sou fã,pois os alunos preparam uma surpresa para os pacientes internados visando a humanização do paciente internado.E o "arraiá" foi divertido demais para Y.,que embora já bem melhor do que quando dera entrada no hospital,ainda não tinha força suficiente para dançar,mas dançou sobre uma cadeira de rodas.Sorriu.Deu gargalhadas,divertiu-se como ninguém deixando para nós todos até um certo constrangimento ao pensar que às vezes reclamamos das coisas.Deixando um exemplo de superação,exemplo de resiliência,exemplo de vida.
  Ela teve alta não estando em 100% de seu estado prévio,mas muito melhor do que entrou e sua mãe com fé de que ela voltará ao normal.Medicamente falando...Tenho certeza que todo prognóstico pode ser mudado pela forma como é encarado.Isso é cientificamente comprovado.Falando como alguém que crê em milagres...acredito que a fé pode curar.Creio que o médico dos médicos também visitou nossa pequena Y.
  Quem sou eu para duvidar do Criador?
 Ah...e para minha surpresa,antes da alta hospitalar de Y.,sua mãe escreveu-me uma linda e emocionante cartinha de gratidão e isso não tem preço!Vale a pena!


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

DIVERTIDAMENTE

DECORAÇÃO RAPUNZEL

VÔMITOS EM JATO